quarta-feira, 24 de setembro de 2014

O verde Cajón del Azul

Como eu comentei no post anterior, tivemos a árdua missão de escolher apenas UMA entre as tantas trilhas que El Bolsón oferece. Acabamos optando pelo Cajón del Azul - cujas fotos de uma água turquesa nos atraíram demais! 

O primeiro procedimento, para quem deseja se aventurar nos bosques e montanhas, é deixar seu nome e um telefone para contato num livro de registros do posto de informações da cidade. Assim eles podem ter um controle de quantos turistas estão em cada trilha, e podem acionar socorro caso alguém demore demais para voltar. El Bolsón é ou não é primeiro mundo??





Logo que saímos do Rincón del Sol (nosso albergue), sentimos um frio absurdo! Era por volta de 7h30 de manhã, e estava soprando um vento tão gelado que chegamos a voltar para pegar mais casacos. Só que dali a menos de 1h o tempo já começou a esquentar, esquentar, esquentar - até quase chegar a 40ºC no início da tarde! Ficamos surpresos com tamanha amplitude térmica no mesmo dia - pra quem fala que viver no RS é difícil por causa do clima, queria ver morando em El Bolsón!

Existem ônibus com frequência de meia em meia hora que saem do centro da cidade (bem próximo ao posto de informações) e levam até a Chacra de Wharton, ponto de partida para a trilha. Logo na descida do ônibus existe um restaurante onde você pode comprar água e sanduíches para levar na mochila. Os preços não são tão bons, e eu acho melhor você comprar algum lanche nos supermercados de El Bolsón, antes de ir para Wharton. A água dos rios que atravessam a trilha obviamente é potável - basta um olhar para saber que uma água tão cristalina assim está mais do que pronta para o consumo. Você só precisa levar garrafinhas de plástico para ir enchendo ao longo do caminho.




Começamos a caminhar, sempre seguindo as abundantes placas e sinais - tem que ser muito habilidoso para se perder no Cajón del Azul! O começo da trilha é uma descida de um pouco mais de meia hora por um caminho pedregoso. Foi já nessa parte que fizemos amizade com um casal de argentinos, de Buenos Aires, que estavam caminhando perto de nós. Muito simpáticos e falantes, ele nos obrigaram a pôr em prática nosso espanhol que até então estava bem guardado.

Ao final da descida, passamos por uma frágil ponte de madeira (com capacidade máxima de UMA pessoa por vez!) e atravessamos um rio.




Pouco tempo depois, outra pontezinha - e esta, a maior recompensa e também uma das paisagens mais incríveis que eu já vi! Dispensando palavras, aí vão as fotos: 









Muito mais bonito que todos os rios e lagos juntos que nós tínhamos visto em Bariloche! E de graça, acessível a todos, exigindo apenas uma leve caminhada! E pensar que nossos planos eram ir embora de El Bolsón sem ter visto esse espetáculo da natureza!

O resto da trilha também é interessante, mas nada que se compare com esse primeiro cenário. É um percurso extenso,  cheio de subidas e descidas, que demora de 7h a 8h (contando ida e volta). Pelo caminho você encontra refúgios - lugares onde pode parar para descansar, tomar café, comer um lanche e se recompor para mais um trecho de caminhada. Além disso, para aquelas trilhas mais longas, você pode até mesmo dormir nos refúgios - em geral por um preço bem módico!

Mas falando em café, preciso continuar puxando o saco de El Bolsón - afinal, o ÚNICO café bom que tomamos, em 26 dias de viagem pela Patagônia, foi em um dos refúgios dessa trilha (se eu não me engano, o refúgio da Plajita). Na Argentina eles têm o costume de tomar café fraco - até aí tudo bem, pois eu também gosto de café fraco. Só que o fraco deles não passa de uma água suja, uma coisa tão sem gosto que mal se pode chamar de café! Em menos de uma semana nós já tínhamos até perdido as esperanças - mas por incrível que pareça, nesse refúgio no meio do nada, uma grata surpresa nos esperava: um café de saquinho! Foi a primeira vez que eu vi isso, até então achava que saquinho só se usava para chá. Pois não é que a tal invenção deu muito certo?? O dono do refúgio esquentou numa caneca a água tirada direto do rio e adicionou o café. Esperou uns 3min, nos serviu e pronto - estava eleito o melhor café de toda a viagem!




Fechando o parêntese sobre o café (cada vez que lembro de alguma coisa me desvio do assunto!), nós conseguimos manter um ritmo muito bom de caminhada, junto com o casal de argentinos. Nosso objetivo era chegar até o famoso Cajón del Azul - que, ao final, se revelou a grande decepção do dia. Era uma espécie de cânion, entre cujos paredões corria um rio. Mas nós só podíamos ver isso de cima de uma ponte, e sinceramente - andar tudo aquilo para tirar ESSA foto???



Aí vai então uma dica para você: faça a trilha do Cajón del Azul somente até chegar naquele rio de água verde com a ponte de madeira! Não vale a pena caminhar mais tantas horas para não ver nada nem parecido com o que você pode ter em menos de 1h! Poupe seu tempo e suas pernas!

Depois do Cajón continuamos caminhando por mais um tempo até o próximo refúgio - o Retamal. De lá, após comer os lanches que tínhamos levado, pegamos a trilha do Nascimento do Cajón del Azul, um lugar muito bonito com uma cachoeira e uma atmosfera inabalável de tranquilidade. Não é a toa que os hippies adoram El Bolsón e sua natureza - tudo lá é paz e amor.




Em seguida, voltamos pelo mesmo caminho da ida, já que infelizmente a trilha não é circular. 

Pegamos o ônibus de volta para o centro de El Bolsón, ainda junto com o casal de argentinos. Como eles iam descer num ponto antes do nosso, nos despedimos no ônibus - e aí ainda mais uma surpresa: na frente de todo mundo, os dois nos cumprimentaram com beijos no rosto! Assim como muitos povos pelo mundo, os homens argentinos também beijam outros homens no rosto. Foi bem estranho para nós, mas logo vimos que ninguém mais no ônibus tinha sequer reparado naquilo! Afinal, eles que eram os "normais", e nós o povo exótico cheio das "nove-horas" para se despedir.

Quando chegamos no centro, fomos direto ao posto de informações agradecer as dicas da atendente e avisar que tínhamos chegado sãos e salvos - e que os nossos nomes já podiam ser riscados do livro de registros da trilha. É muito importante que você faça isso ao voltar, porque senão eles vão ter que lhe telefonar para saber se está tudo bem.

Antes de dormir, pensei e concluí que o dia 3 de fevereiro tinha ficado marcado como o melhor dia da viagem até então. Apesar de termos passado o tempo todo caminhando e cansando as pernas, o dia tinha sido o mais surpreendente possível:

- a temperatura mudou demais;
- o Cajón era sem graça;
- a ponte no rio de água verde valeu o passeio inteiro;
- conseguimos tomar um ótimo café de saquinho;
- fizemos novos amigos;
- tivemos uma despedida inusitada no ônibus!

Algumas surpresas boas, outras nem tanto - mas afinal viajar é isso, é estar sempre aberto para os imprevistos e tirar de tudo o maior proveito possível!

No próximo post, um pedacinho do Chile - vamos conhecer o famoso Lago Puelo!








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